13 de fevereiro de 2016

Relato de Trepadas 17, por Luís Alberto


Relato por Luís Alberto (o devorador da esperança. Aquele que arrota enquanto devora as suas vísceras).

  
Era uma primavera quente em 2015,as informações sobre locais e horários da expedição já haviam sido detalhadas,inclusive o Monte Rushmore(depois de passar pelas mãos dos profissionais da Yellow Design) já estampava o vulto dos mais bravos guerreiros trepadores aguardando feito rocha o dia 15/11/2015 para se lançarem ao campo de batalha conhecido agora como Pico do Capim Amarelo. 

O Monte Rushmore pela ótica trepatoriana

Abastecido de toda tralha que precisava avancei pelas estadas rumo à capital mineira,de carona em carona consegui chegar ao nosso ponto zero,conhecido por RISP.Aguardei nesse lugar com cheiro de mofo e oficiais aguardando nossa partida na manhã seguinte.
Durante esse período de espera fiz contato com alguns colegas,amigos e monstros guerreiros trepatorianos entre contatos virtuais e reais. À medida que as horas se passaram o céu se fechou,se carregou e anunciou uma tempestade que veio com pressa,chuva forte e voraz,só não mais que eu e minha bravura indômita. Nada pode nos deter.Já empurramos carruagens morro  e lama acima,nos perdemos por vezes,passamos por vários testes naturais...essa chuva ia nos divertir!!
Mas foi aí que confesso,senti decepção ao perceber que até mesmo alguns dos mais valentes abandonaram a missão temendo a desafiadora tempestade.Mantive a esperança e me direcionei ao presidente Polar que carregava a mesma sede de batalha e também compreendia o meu sacrifício de deslocamento e pernoites nos terríveis fossos do alojamento da 6ª Cia.Nesse instante um dos desistentes disse que a tempestade seria tamanha que esconderia o sol.Então a resposta veio como um brado: "ENTÃO SUBIREMOS NA SOMBRA!PREPAREM-SE PARA A GLÓRIA,POIS AQUI É TREPATORS!". Todos então gritaram :"Raul,Raul,Raul!!!"





O Velho e tradicional ponto de encontro


Tão logo partimos e tão logo a temida chuva cessou.Na viagem paramos em Três Corações para alguns crentes saudarem a estátua do rei Pelé,o senhor do futebol.saudações e fotos foram tiradas.É interessante lembrar que essa foi uma das poucas missões em que não utilizamos nenhum guia,todo o trajeto foi feito às nossa custas,com isso tivemos liberdade para fazermos quantas paradas quiséssemos.Chegamos ao local de partida sem muito esforço,arrumamos as tralhas e começamos a subir.Marcos era um iniciante no grupo,tive medo de ter que dividir a barraca com ele,apesar de ser um cara legal ele não para de comer frango e batata doce.Deve ser uma verdadeira máquina de peidar. Não queria inalar isso a noite toda.Outro que iniciava no grupo era Souza Júnior,esse eu já conhecia de velhas batalhas.É um soldado forjado no terrível curso de 2008,o qual eu também estava.

Quem foi melhor? Pelé ou Polar?

Enquanto uns caminham para um lado,Delegado caminha para o outro e o Johnny descansa. Tudo normal.

A primeira parada foi no local conhecido por Toca do Lobo,é um lugar de beleza extrema onde passa o riacho e do outro lado fica uma caverna,possível morada dos demoníacos Trolls da montanha.
Parada breve mas o suficiente para descansar e trocar uma idéia com meu amigo Braga que compartilha comigo o mesmo gosto de usar Paracords no punho e mesmo que precisar usar uma corda finge que não tem nenhuma preguiça de desfazer os nós de tanto capricho...hehe!Essa foi a segunda trepada depois de meu proclamado retorno ao grupo e também a segunda trepada que dividi a frente com o maratonista Marcelão que apesar das poucas vezes de contato conquistou meu respeito e admiração,claro que isso não me impediu de rir pra caráleo quando falaram que ele parecia uma velha senhora pois usava um lenço tático na cabeça.Estar à frente de uma expedição é uma honra para mim mas isso não é nenhum tipo de corrida ou coisa parecida,apenas mostra para mim mesmo que o meu treinamento físico está valendo a pena,alguém tem que puxar a caravana.
Lá vem o negão,cheio de paixão...ticatá,ticatá,ticatá  
Bravos e frangos,todos juntos.
Evaldo liderava entre os últimos

Preguiça e vontade de fazer nada juntas nesta imagem

Chegamos à uma clareira a qual nos instalamos,subimos acampamento,montamos as barracas.Dividi minha barraca com o Johnny Desídia e o Agenor,apesar de descobrir que o Johnny sandálias de Seninha tem pés femininos fiquei tranquilo em dividir a barraca com esses dois caras pois considero muito amigos e não haveria nenhum risco homossexual noturno. 
A noite estava quente,logo o Delegado se pôs a mexer seu caldeirão como um velho bruxo preparando a nossa ração.Durante a refeição ele olhou para todos e disse em vivos pulmões: "Trepatorianos!Façam um bom jantar nesta noite,pois amanhã almoçaremos no inferno!'' E todos gritaram: "RAUL!RAUL!RAUL!".
O desânimo contagiante de Jonathan
Agenor:protagonista das melhores fotos e das fotos mais gays.


Quem vai dormir com o "Pés de Fada?"
Marcelão com saudade do Zaca na barraca

A noite estava quente,logo o Delegado se pôs a mexer seu caldeirão como um velho bruxo preparando a nossa ração.Durante a refeição ele olhou para todos e disse em vivos pulmões: "Trepatorianos!Façam um bom jantar nesta noite,pois amanhã almoçaremos no inferno!'' E todos gritaram: "RAUL!RAUL!RAUL!".
Tivemos uma prevista falta d'água no acampamento,havia um fio de água que corria ali perto,mas o caminho era deveras perigoso,então foram escolhidos apenas três dos mais bravos para essa missão,aqueles que parecem descender do própio Hércules:Eu,o Presidente e o Delegado,assim partimos mata adentro na mais completa penumbra.Havia à nossa frente um paredão colossal de rocha que integra o pico e tal paredão nos permitia ouvir o eco das lendas sobre os abomináveis trolls da montanha que eram proclamadas pelo Heraldo,o príncipe dos mendigos que se postava em um ponto elevado do acampamento e era rodeado pelos seus ouvintes seguidores. Grande Heraldo boladão,querido amigo que compartilho um pouco de história geral,culturas antigas,culturas populares,DST,enfim...é um cara maneiro e por mais embates que tenha com o nosso bundudoso presidente,todos conhecem sua importância como um dos fundadores do grupo,o pacto silencioso que selamos naquela primeira missão trepatoriana perpetuará,não importa o que aconteça.

Rango pesado para renovar as forças

O pajé e sua poção mágica          

Goteiras à noite e todo mundo uma carniça no outro dia
Marcelão: 20 kg mais magro. Jonathan: 20 x mais preguiçoso.

Não foi fácil buscar essa água,não tinha uma trilha,o mato era fechado,a noite não estava clara ,as pilhas de lanterna começavam a falhar,o caminho era perigoso tanto ida quanto volta,mas pra gente missão dada é missão cumprida mano e assim foi.Nunca é fácil dormir de verdade nas nossas expedições e essa noite foi um pouco mais difícil.Fui voluntário para carregar uma lona tão grande que cobriria o acampamento todo mas a noite estava tão quente que achamos desnecessário e fomos castigados por isso.A chuva veio com a força de um Titã e já não dava para fazer nada,quase tudo que estava fora das barracas se molhou e no meu caso até dentro da maldita barraca barata molhou tudo,resultado disso foi uma noite inteira mal dormida.Olhei para a cara de um dos meus companheiros de barraca e vi estampado a lamúria,nessa hora me lembrei da importância de se manter o moral elevado,não dormi mas as horas em que passei deitado e de olhos fechados contaram como meu descanso,afinal mano,é mais fácil encarar uma montanha de cabeça erguida e peito aberto que contando os passos e se lamentando pela noite que já se foi.

Evaldo e Souza juntos. Cheiro de desistência.
Hora de deixar as crianças em local seguro e partir



Pico do Capim Amarelo.Prazer!

No dia seguinte degustei o café preparado com carinho pelo Delegado enquanto ouvia histórias perniciosas sobre pederastias em barracas durante a madrugada.É muito bom acordar num lugar desses,nenhum maldito carro ou vizinho fazendo barulho,longe de toda negatividade,dá para entender um pouco o significado de "paz". Partimos para um ataque fulminante ao Pico do Capim Amarelo mas quando eu tinha acabado de me aquecer anunciaram que havíamos chegado ao ponto final. Não podia ser...olhando à frente se via um pico tão alto quanto desafiador e me lembrei que até então não tinha visto pelo caminho nenhum maldito "capim amarelo". À medida em que o resto do pessoal ia chegando fui indagando afim de saber quem encararia marchar até o fim daquele monstruoso pico e para minha surpresa(ou não) os mais coroas do grupo toparam ir até o fim. O Marcelão se adiantou ,pensei em esperar o presidente  pra saber sua opinião,afinal porra,somos um grupo,por mais que eu queira não acho certo fazer nada sem pelo menos a concordância da maioria.Mas,cara,eu não podia deixar o Marcelo e agora o Delega também subir sem eu (rs),me passou outro pensamento de que dando o exemplo o restante nos seguiria mas o único que nos seguiu foi o presidente Polar.
"Desistir é para sempre".
São Paulo à esquerda. Minas à direita. Uai,mano!

É isso mesmo. Capim elefante.
Bambuzal no alto da trilha
Agora sim,estava mais bonito e divertido,as trilhas mais bonitas e com aquele gosto de que era para poucos,passamos por bambús,subimos utilizando cordas e finalmente estava vendo muito capim amarelo pelo caminho. Encontrei uma cebola abandonada onde outrora fora um acampamento e encaixei em uma planta sinistra que havia pelo caminho.Ficou maneiro,o Marcelão acreditou na minha lorota que aquilo era a famosa "cebola da montanha" . O presidente acreditou tanto que até comeu,hehehehehe....Chegamos ao cume.Primeiro o Marcelo,cheguei logo em seguida e depois o Delega e completando o quarteto fantástico, o Polar. Achei interessante que lá em cima tem um bloco de metal que guarda um caderno com caneta onde registramos nossa façanha com uma bela arte do Delegado. Fizemos orações (sim) e vídeos pomposos.Finalmente pude ter os meus momentos de silêncio e contemplação,agradeci a cada estrela que morreu para eu estar ali,cada fóton de sol que atravessou uma grande distância para iluminar tudo aquilo que minha retina gravava.


Um dos cinco pontos de corda no final da trilha
Caras sem camisa forçam a musculatura nas fotos


Super gêmeos...ativar!

Achei a sombra de um arbusto de capim amarelo e me sentei para descansar. O lugar era mágico e me deu visões além do alcance. Eu pude ver as explosões de radiação gama de estrelas gigantes serem convertidas em energia pura pelas suas próprias massas,flashes de luz que brilham do outro lado do universo muito antes de a Terra ter se formado,vi o brilho invisível das microondas da radiação de fundo deixado pelo Big Bang,estrelas vagando a milhares de quilômetros e o espaço tempo se curvando em volta delas até terminar tudo numa aniquilação intergaláctica que faria a fúria de todos os deuses terrestres parecer com uma simples brincadeira de criança.De repente me interromperam.Era o bundudão chamando para ir embora.



Sabe ler,escrever e cozinhar. Pode casar!
Livro do cume
Emoção e agradecimento

Os ratinhos também bebem dessa água


Assim que chegamos de volta ao acampamento percebemos que os companheiros que ficaram se adiantaram e deixaram tudo pronto para iniciar o nosso retorno definitivo.Quero ressaltar aqui que essa atitude deles foi salutar pois assim que colocamos as mochilas nas costas inesperadamente uma tempestade horizontal (literalmente) nos arrebatou. A chuva batia de leste a oeste como um soco,alguns chegaram até a se deitar no chão,não sei se por medo ou contemplação. Era inútil resistir ou tentar se esconder,enfrentamos bravamente essa amostra grátis de dilúvio até chegar aos veículos.

Conquista!!
Descanso
Contemplação
Esforço




Pegamos a estrada de volta à Belo Horizonte,mais uma missão concluída com sucesso.Todos estavam sãos e salvos e agora se encontravam espalhados como estrelas em um céu sem nuvens aguardando o chamado para a próxima e sangrenta aventura. 


Capim Amarelo...agradeço por mais esta conquista...
...aos amigos que chegaram...aos que ficaram pelo caminho...todos importantes.
O contato intenso com a natureza nos faz mais humildes.
E viajar antes de tudo é retornar. Sãos e salvos para as pessoas que nos amam.
Isto é Trepators!

Informações complementares: 
No retorno Antônio Marcos e Evaldo se depararam com uma onça preta na nascente de água acima do acampamento.
Na "Toca do Lobo" encontramos um amigo de Facebook que nos reconheceu pelo escudo da camisa. Seu nome:Vanderley Santiago.
Próximo do cume,na descida,fomos ultrapassados por um atleta ultramaratonista morador de São Paulo,primo do vice presidente do Cruzeiro Bruno Vicintin.